terça-feira, 21 de junho de 2011

Digitalização das cidades repete desigualdade regional e exclusão digital

Jornalista Alberto Perdigão - editor do Blog da Dilma em Fortaleza - aperdigao@terra.com.br
Acompanhei com interesse a apresentação do Índice Brasil de Cidades Digitais, recém lançado pelo Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicação - CPqD e pela editora Momento Editorial. O Centro de Pesquisa de Campinas (SP), que é uma referência no país na produção científico-tecnológica, oferece um ranking de municípios, podendo vir a ser este o parâmetro de medição do grau de digitalização das cidades brasileiras que utilizam tecnologias da informação e comunicação em suas gestões.
O índice é uma espécie de IDH-TIC a medir a quantidade e a qualidade da utilização de soluções para melhorar a administração pública, incluindo o diálogo com os cidadãos e, finalisticamente, a vida dessas pessoas. Mede não só a infraestrutura disponibilizada para governos e sociedade, como a oferta de banda larga ou de telecentros, mas também a acessibilidade e a usabilidade dos equipamentos e programas, inclusive em relação às limitações de pessoas com deficiência ou reduzido letramento.

O índice, construído a partir de nove critérios de avaliação, é nota dez. Não se propõe a ser uma apuração do tipo FIB-TIC, para medir a felicidade interna bruta proporcionada pela digitalização de territórios, como particularmente eu gostaria. Mas revela claramente, logo em sua primeira edição anual, as contradições de um país democrático e injusto, de um país que se pretende digitalizado e digitalmente includente. Um Brasil analógico, cujos governos e cidadãos, em sua grande maioria, ainda não usam computador e internet.
Dos 300 municípios que toparam participar do ranking, apenas 75, ou 25% do total, passaram para a fase de classificação. A partir desta amostra, pode-se afirmar que apenas uma em cada quatro cidades brasileiras usa as tecnologias da informação de forma planejada e com algum resultado. Das 75 aprovadas, apenas quatro (5,3%) alcançaram o nível mediano de desempenho, serviços eletrônicos – Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre e Vitória -, todas elas localizadas no seleto grupo de capitais do Centro-Sul que formam o chamado Brasil “A”.
Aquelas são cidades que já têm cobertura total para internet pública, mas ainda apresentam problemas de acessibilidade a pessoas com deficiência ou baixa escolaridade. As sete cidades seguintes (duas delas empatadas), ocupantes do segundo nível atingido, telecentro, são da mesma região. A primeira cidade do Nordeste a aparecer na lista, de forma surpreendente, é Tauá, localizada numa das áreas mais secas e pobres do Ceará, que pode estar caminhando na saudável contramão que as infovias permitem.
Tauá, com seus 54,3 mil habitantes, ocupa a décima posição, um ano depois de figurar entre as cidades sem biblioteca pública municipal, segundo o Primeiro Censo Nacional das Bibliotecas Públicas Municipais, realizado pela Fundação Getulio Vargas e Ministério da Cultura. Em Tauá, é possível acessar qualquer grande biblioteca do mundo gratuitamente, de sete telecentros, de quatro quiosques digitais ou de qualquer dispositivo sem fio, em praças do Centro, estação rodoviária, sedes do Sebrae e do programa Cidade Digital.
Também contrariando a lógica excludente, Icapuí, outra cidade cearense, foi reconhecida como destaque/acesso público pelo Índice, ao lado de três municípios do Rio Grande do Sul, Ibirapuitã (acessibilidade), Campo Bom (cobertura geográfica) e Porto Alegre (serviços e aplicações). Graças à rede de banda larga em implantação pelo governo do Ceará, os estudantes icapuienses terão pontos de acesso a Internet em todas as unidades de ensino, além de bibliotecas virtuais e telecentros para suas famílias.
Até a posição 25 do ranking, 1/3 do total, só aparece uma segunda cidade do Nordeste, Recife, nenhuma outra do Norte. Insisto neste ponto, porque esta seja talvez a mais importante revelação do Índice. Faz-me pensar que o modelo de digitalização das cidades brasileiras, sem um Plano Nacional de Banda Larga e sem uma política pública de acesso e acessibilidade da União para os municípios, promoverá a desigualdade regional e a exclusão digital, apartando do Brasil digital os territórios e cidadãos que mais precisam.
É difícil pensar na digitalização de uma cidade pobre e isolada como prioridade, como deveria ser. É que muitos municípios do Nordeste, por exemplo, ainda têm dificuldade de abastecimento de água saudável aos seus cidadãos. Outros, na região Norte, convivem ainda com a impossibilidade de oferecer atendimento médico-hospitalar a menos de 12 horas de voadeira de casa. Não obstante as TICs, o Brasil ainda é um país que não se vê, portanto não se reconhece. É um país que não se expressa, portanto não se pertence.
10 MUNICÍPIOS MELHOR CLASSIFICADOS NO ÍNDICE BRASIL DE CIDADES DIGITAIS
1.º Belo Horizonte(MG; 2.ºCuritiba(PR); 3.ºPorto Alegre(RS); 4.ºVitória(ES); 5.ºIbirapuitã (RS); 5.ºJundiaí(SP); 6.ºCampinas(SP); 7.ºSantos(SP); 7.ºSão Carlos(SP); 8.ºTarumã(SP); 9.ºSão Paulo(SP);10.ºTauá (CE). Fonte: CPQD.
4 DESTAQUES NO ÍNDICE BRASIL DE CIDADES DIGITAIS
Acessibilidade - Ibirapuitã (RS)
Acesso Público - Icapuí (CE)
Cobertura Geográfica - Campo Bom (RS)
Serviços e Aplicações - Porto Alegre (RS)
Fonte: CPQD.

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