Marie Claire - Por Carla Gullo e Maria Laura Neves:
A Dilma Rousseff que todos conhecem lutou contra a ditadura, foi presa e torturada. Virou ministra, enfrentou várias crises no governo e é candidata não oficial à presidência nas próximas eleições. A Dilma que quase ninguém conhece sentia culpa de ir trabalhar e deixar a filha em casa, ri de si própria e se diverte com os programas de sátira a seu respeito. Diz que se sentiu nua quando a imprensa começou a vasculhar sua vida pessoal. Em entrevista exclusiva à Marie Claire, ela fala que preferia os tempos em que os homens cortejavam as mulheres, acha que esse negócio de ficar não funciona bem para nós e diz que é a favor da legalização do aborto.
O gabinete da ministra da casa civil, Dilma Rousseff, 61 anos, é amplo e bem arrumado. Um sofá, duas poltronas, uma mesa de centro com livros ilustrativos do Brasil. Atrás da grande mesa de trabalho, um bufê com alguns porta-retratos: uma foto da filha, Paula, advogada de 31 anos, seu maior xodó, outra com o presidente. Uma imagem de Iemanjá, 'presente do governador da Bahia, Jaques Wagner', e outras duas de santas barrocas. Em uma das paredes, duas fotos ampliadas dela com Lula. A mais famosa é a que ele coloca as mãos sujas de petróleo nas costas da ministra, em uma espécie de 'batismo' de óleo. Um telefone que é usado somente para falar com ele. São sinais que mostram sua relação afinada com o presidente. Dilma é hoje a mulher mais forte do governo. À frente do PAC (Plano de Aceleração ao Crescimento), é a candidata natural do PT à presidência da República. Entramos no gabinete esperando encontrar a Dilma que todo mundo conhece - ou acha que conhece. Dura, séria, um tantinho mal-humorada. Encontramos uma mulher sorridente, que nos cumprimentou com dois beijinhos. Vestida num terninho azul-claro, regata branca, colar de pérolas, relógio, fitinha do Senhor do Bonfim amarrada no pulso (presente de Flora Gil, objeto de um pedido do qual nem lembra mais), Dilma nos deixou à vontade logo nos cinco primeiros minutos de conversa. Sem brincos e sentada em uma mesa redonda de reunião, com vista para a Esplanada dos Ministérios, Dilma puxou uma edição de Marie Claire trazida por sua assessora e apontou uma foto da atriz Larissa Maciel, que fez o papel da cantora Maysa na minissérie global. 'Como essa menina está linda nesta foto. Mais bonita do que na minissérie', disse. 'Sabe por quê? Porque aqui as feições estão suavizadas.' Assim como as dela mesma, depois da plástica feita no início do ano. Ela age como se ainda estivesse se acostumando ao novo visual - enquanto fala, ajeita os cabelos, puxa para frente, joga um pouco para o lado.
Economista de formação, mas política de carreira, Dilma fala alto, bastante e rápido. Bate com as mãos cerradas na mesa quando discursa sobre as medidas econômicas do governo. Usa o mesmo tom grave ao se referir à ditadura militar. Seus subordinados costumam ser tratados com a mesma severidade. Mas na hora da conversa, é bem-humorada. Adora falar sobre a filha. Sagitariana e separada de dois casamentos, a mineira de Belo Horizonte passou boa parte da vida adulta em Porto Alegre. Mistura os sotaques e as expressões das duas cidades. Ora usa 'tu', ora 'ocê'. Ri alto quando o assunto são as caricaturas que a imprensa fez dela depois da plástica, não se esquiva de perguntas sobre sua vida íntima e se empolga na hora de falar das influências intelectuais que fizeram parte da sua geração.
A ministra da Casa Civil começou a fazer história quando, aos 15 anos, entrou para o movimento estudantil para lutar contra a ditadura militar. Aos 19, vivia na clandestinidade. Foi uma das líderes de duas importantes organizações da esquerda radical, o Colina e a VAR-Palmares. Foi nessa época que se casou, pela primeira vez, com o jornalista Cláudio Galeno. Fez treinamentos de guerrilha, aprendeu a montar e desmontar fuzis, mas diz que nunca trocou tiros com soldados do exército ou policiais militares. Ela afirma que fazia parte da inteligência das organizações. Presa em 1970, ficou três anos na cadeia, onde foi barbaramente torturada. Ao falar sobre essa época, mostra sentimentos dúbios. Às vezes discursa com indignação. Às vezes fala baixo, pausado. Mas em nenhum momento sugere arrependimento. Deixa claro que tem orgulho do que viveu.Em liberdade, casou-se com o advogado gaúcho Carlos Araújo, também ligado à militância de esquerda. Os dois se mudaram para Porto Alegre, onde fizeram carreira política pelo PDT. Dilma foi secretária na área de energia do governo gaúcho. Os resultados do trabalho feito no Sul a conduziram ao primeiro posto no governo Lula, no Ministério de Minas e Energia, em 2003.
O segundo casamento terminou em 2000. Dilma perdeu o pai, o búlgaro Pedro Rousseff, em consequência de diabetes, quando tinha 15 anos. Em 1977, aos 30, perdeu a irmã mais nova, Zana, de um tipo raro de infecção. Ela conta esses fatos sem a voz embargada ou em tom de vítima. Dilma Rousseff parece não ter nascido para esse papel. Sempre que lembra algum momento triste, a imagem da mulher forte permanece. Nada de olhar para baixo, voz trêmula ou esquiva. Mas fica claro que prefere conversar sobre assuntos alegres. Empolga-se e dá um sorriso gostoso quando diz que se prepara para ser avó. E com o mesmo sorriso afirma que não se sente solitária pelo fato de não ter um namorado ou marido.
Na política, ganhou notoriedade depois de assumir a chefia da Casa Civil, em 2005, no lugar de José Dirceu. Se, por um lado, conseguiu manter uma imagem de respeito em um governo desgastado pela crise do mensalão, por outro protagonizou algumas crises políticas. Foi acusada de favorecer um grupo de empresários na venda da Varig Log (a empresa de transportes de carga da antiga Varig) e de ter mandado produzir um dossiê clandestino com os gastos do governo Fernando Henrique Cardoso. Só a última acusação acabou em inquérito policial e o Supremo Tribunal Federal retirou a ministra da investigação (a decisão ainda não é definitiva). Aqui, ela fala sobre maternidade, amor, tortura, cotidiano e um pouquinho de política.
A Dilma Rousseff que todos conhecem lutou contra a ditadura, foi presa e torturada. Virou ministra, enfrentou várias crises no governo e é candidata não oficial à presidência nas próximas eleições. A Dilma que quase ninguém conhece sentia culpa de ir trabalhar e deixar a filha em casa, ri de si própria e se diverte com os programas de sátira a seu respeito. Diz que se sentiu nua quando a imprensa começou a vasculhar sua vida pessoal. Em entrevista exclusiva à Marie Claire, ela fala que preferia os tempos em que os homens cortejavam as mulheres, acha que esse negócio de ficar não funciona bem para nós e diz que é a favor da legalização do aborto.
O gabinete da ministra da casa civil, Dilma Rousseff, 61 anos, é amplo e bem arrumado. Um sofá, duas poltronas, uma mesa de centro com livros ilustrativos do Brasil. Atrás da grande mesa de trabalho, um bufê com alguns porta-retratos: uma foto da filha, Paula, advogada de 31 anos, seu maior xodó, outra com o presidente. Uma imagem de Iemanjá, 'presente do governador da Bahia, Jaques Wagner', e outras duas de santas barrocas. Em uma das paredes, duas fotos ampliadas dela com Lula. A mais famosa é a que ele coloca as mãos sujas de petróleo nas costas da ministra, em uma espécie de 'batismo' de óleo. Um telefone que é usado somente para falar com ele. São sinais que mostram sua relação afinada com o presidente. Dilma é hoje a mulher mais forte do governo. À frente do PAC (Plano de Aceleração ao Crescimento), é a candidata natural do PT à presidência da República. Entramos no gabinete esperando encontrar a Dilma que todo mundo conhece - ou acha que conhece. Dura, séria, um tantinho mal-humorada. Encontramos uma mulher sorridente, que nos cumprimentou com dois beijinhos. Vestida num terninho azul-claro, regata branca, colar de pérolas, relógio, fitinha do Senhor do Bonfim amarrada no pulso (presente de Flora Gil, objeto de um pedido do qual nem lembra mais), Dilma nos deixou à vontade logo nos cinco primeiros minutos de conversa. Sem brincos e sentada em uma mesa redonda de reunião, com vista para a Esplanada dos Ministérios, Dilma puxou uma edição de Marie Claire trazida por sua assessora e apontou uma foto da atriz Larissa Maciel, que fez o papel da cantora Maysa na minissérie global. 'Como essa menina está linda nesta foto. Mais bonita do que na minissérie', disse. 'Sabe por quê? Porque aqui as feições estão suavizadas.' Assim como as dela mesma, depois da plástica feita no início do ano. Ela age como se ainda estivesse se acostumando ao novo visual - enquanto fala, ajeita os cabelos, puxa para frente, joga um pouco para o lado.
Economista de formação, mas política de carreira, Dilma fala alto, bastante e rápido. Bate com as mãos cerradas na mesa quando discursa sobre as medidas econômicas do governo. Usa o mesmo tom grave ao se referir à ditadura militar. Seus subordinados costumam ser tratados com a mesma severidade. Mas na hora da conversa, é bem-humorada. Adora falar sobre a filha. Sagitariana e separada de dois casamentos, a mineira de Belo Horizonte passou boa parte da vida adulta em Porto Alegre. Mistura os sotaques e as expressões das duas cidades. Ora usa 'tu', ora 'ocê'. Ri alto quando o assunto são as caricaturas que a imprensa fez dela depois da plástica, não se esquiva de perguntas sobre sua vida íntima e se empolga na hora de falar das influências intelectuais que fizeram parte da sua geração.
A ministra da Casa Civil começou a fazer história quando, aos 15 anos, entrou para o movimento estudantil para lutar contra a ditadura militar. Aos 19, vivia na clandestinidade. Foi uma das líderes de duas importantes organizações da esquerda radical, o Colina e a VAR-Palmares. Foi nessa época que se casou, pela primeira vez, com o jornalista Cláudio Galeno. Fez treinamentos de guerrilha, aprendeu a montar e desmontar fuzis, mas diz que nunca trocou tiros com soldados do exército ou policiais militares. Ela afirma que fazia parte da inteligência das organizações. Presa em 1970, ficou três anos na cadeia, onde foi barbaramente torturada. Ao falar sobre essa época, mostra sentimentos dúbios. Às vezes discursa com indignação. Às vezes fala baixo, pausado. Mas em nenhum momento sugere arrependimento. Deixa claro que tem orgulho do que viveu.Em liberdade, casou-se com o advogado gaúcho Carlos Araújo, também ligado à militância de esquerda. Os dois se mudaram para Porto Alegre, onde fizeram carreira política pelo PDT. Dilma foi secretária na área de energia do governo gaúcho. Os resultados do trabalho feito no Sul a conduziram ao primeiro posto no governo Lula, no Ministério de Minas e Energia, em 2003.
O segundo casamento terminou em 2000. Dilma perdeu o pai, o búlgaro Pedro Rousseff, em consequência de diabetes, quando tinha 15 anos. Em 1977, aos 30, perdeu a irmã mais nova, Zana, de um tipo raro de infecção. Ela conta esses fatos sem a voz embargada ou em tom de vítima. Dilma Rousseff parece não ter nascido para esse papel. Sempre que lembra algum momento triste, a imagem da mulher forte permanece. Nada de olhar para baixo, voz trêmula ou esquiva. Mas fica claro que prefere conversar sobre assuntos alegres. Empolga-se e dá um sorriso gostoso quando diz que se prepara para ser avó. E com o mesmo sorriso afirma que não se sente solitária pelo fato de não ter um namorado ou marido.
Na política, ganhou notoriedade depois de assumir a chefia da Casa Civil, em 2005, no lugar de José Dirceu. Se, por um lado, conseguiu manter uma imagem de respeito em um governo desgastado pela crise do mensalão, por outro protagonizou algumas crises políticas. Foi acusada de favorecer um grupo de empresários na venda da Varig Log (a empresa de transportes de carga da antiga Varig) e de ter mandado produzir um dossiê clandestino com os gastos do governo Fernando Henrique Cardoso. Só a última acusação acabou em inquérito policial e o Supremo Tribunal Federal retirou a ministra da investigação (a decisão ainda não é definitiva). Aqui, ela fala sobre maternidade, amor, tortura, cotidiano e um pouquinho de política.
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