segunda-feira, 27 de julho de 2009

''É difícil ganhar uma eleição twittando"

Ben Self: estrategista de campanha na internet;
Americano que ajudou a criar a campanha online de Obama acha que, sem mobilizar as pessoas, a internet não é eficaz
Julia Duailibi - Estadão -Inspirados pela experiência da campanha presidencial americana de 2008, os partidos políticos que disputarão a corrida de 2010 começaram a olhar para a internet com mais atenção. Marqueteiros ligados tanto ao PSDB como ao PT estão de olho na Blue State Digital (BSD), empresa americana que criou a estratégia na rede para a campanha de Barack Obama a presidente dos Estados Unidos.Ben Self, um americano de Kentucky, de 32 anos, é um dos jovens rostos por trás da bem-sucedida, e excessivamente elogiada, campanha online que ajudou a levar Obama à vitória. Fundador da BSD, ele ajudou a formatar a estratégia que arrecadou nada menos que US$ 500 milhões via internet. Foram obtidas cerca 6,5 milhões de doações online - uma média de US$ 80 por doação -, o que criou um novo paradigma sobre financiamento de campanha nos EUA e no mundo. Uma das sacadas da BSD foi pulverizar as doações por várias páginas de relacionamento na internet, que tinham em comum o apoio à campanha de Obama. As pessoas entravam na rede, doavam, articulavam eventos pró-campanha e ainda participavam de grupos de discussão sobre a arrecadação. Milhões de dólares foram doados em questão de dias. "Nós descobrimos que as pessoas adoram fazer esse tipo de conexão, mesmo que elas não se conheçam. E elas voltam para doar 3, 4, 5 dólares", afirmou Self, em entrevista concedida ao Estado de seu escritório nos EUA.
A empresa que Self mantém com outros três sócios, e a colaboração na equipe de Obama de outros nomes, como Chris Hughes, fundador do Facebook, lançou uma nova forma de fazer e financiar campanhas. "Acho que qualquer candidato que vire as costas para isso (internet) está perdendo uma oportunidade-chave e uma grande vantagem." Para ele, a rede não é um local de persuasão, mas de articulação. "É muito difícil ganhar a eleição twittando"Você precisa motivar as pessoas, isso ajuda a ganhar eleição. Isso significa falar com os eleitores, amigos, doar dinheiro", disse, em referência ao microblog de relacionamentos, que virou mania entre políticos brasileiros. Ex-diretor de tecnologia do Partido Democrata, Self esteve em maio no Brasil. Ele se recusa a comentar qualquer negociação com partidos brasileiros.
Eis a entrevista
Como a Blue State Digital começou a trabalhar para Obama? A BSD foi fundada em 2004, durante a campanha de Howard Dean (democrata que disputou as primárias daquele ano) para a Presidência. Desde 2004, trabalhamos para vários candidatos, partidos políticos e organizações sem fins lucrativos. Ficamos conhecidos pelo trabalho que fizemos para vários candidatos nos Estados Unidos e também pelo nosso trabalho para o Partido Democrata. Eles continuam sendo nossos clientes.Então, quando a campanha de Obama começou, em 2007, nós éramos os mais qualificados, sob certo aspecto, para dar a eles a tecnologia de que precisavam. Eles nos ligaram, dez dias, eu acho, antes de anunciarem que iriam concorrer e disseram: "Ei, nós queremos fazer uma campanha de um jeito diferente e queremos usar as suas ferramentas e a sua tecnologia".
O que vocês fizeram para o Partido Democrata? Nós tivemos um grande papel no trabalho para Howard Dean. Ao gerenciarmos a estratégia de internet e de tecnologia, demos as nossas ferramentas e a nossa tecnologia ao partido. Eu estava intimamente envolvido porque era diretor de tecnologia lá. Então temos trabalhado muito próximos aos democratas desde 2005.
A internet foi determinante para a vitória de Barack Obama? Não diria que a internet pode fazer ou derrubar o candidato. Obviamente, é muito importante e traz muitas vantagens, mas não foi só a internet que fez o senador Obama presidente, foi uma série de fatores conjuntos.Mas a internet foi a grande novidade da campanha, com a arrecadação online recorde.É difícil apontar para qualquer fator e dizer: isso fez a diferença. Havia tantas coisas maravilhosas sobre o nosso candidato, que qualquer uma poderia ser apontada como a que fez a diferença. No entanto, acho que a grande diferença na forma como a campanha de Obama usou a internet, em relação ao que os outros fizeram no passado, é que ela entendeu como usar a rede para ajudar a conectar voluntários dando a eles ações, que realmente fizeram a diferença na campanha. Então essa foi a grande mudança.
Essa percepção de que a internet faria a diferença já estava presente desde o começo da campanha? Estava bem clara para todo mundo, no começo da campanha, a importância da internet. Todo mundo já sabia que seria uma peça-chave na campanha.
O político que não apostar na internet já está em desvantagem? Sempre haverá candidatos que se recusarão a abraçar a novas tecnologias. Essa é uma ferramenta importante para falar com eleitores e também para motivá-los. A campanha do Obama nos ensinou que existe uma grande vantagem em ter um relacionamento dinâmico e uma estratégia online. Então, acho que qualquer candidato que vire as costas para isso está perdendo uma oportunidade-chave e uma grande vantagem.
Mesmo em países, como o Brasil, em que a internet é menos acessível que nos Estados Unidos?
É claro que a penetração em algum nível é necessária. É um investimento de tempo.
Qual ferramenta indispensável que uma campanha online deve ter? Um website dinâmico e interessante que traga pessoas para a campanha e permita que elas façam parte dela. E tem de ter um mailing poderoso, que contenha milhares, milhões de pessoas nele. É provavelmente a peça mais importante de qualquer campanha online.
É mais importante, de certa forma, que um bom website.
E os sites de relacionamento? Depende de como se usa e de qual sua estratégia geral. Há um papel para eles, mas não são mais importantes que o website, nem que o e-mail, de jeito nenhum. É uma ferramenta, mas é muito difícil ganhar a eleição "twittando". Você precisa motivar as pessoas, isso ajuda a ganhar eleição. Isso significa falar com os eleitores, amigos, doar dinheiro. Se você tem um website que fala de você e no qual os seus apoiadores opinam, mas que não motiva seus eleitores para nenhuma ação, você não vai a lugar nenhum.
Qual o custo de uma estrutura dessas para uma campanha eleitoral? A gente não anuncia quanto cada um dos nossos clientes paga. Mas, claro, a gente trabalha para clientes grandes e pequenos. Alguns grandes, como a campanha do Obama, e os menores, que são as organizações sem fins lucrativos. Temos uma série de ferramentas que nós autorizamos os clientes a usar. Clientes que não podem bancar os custos se beneficiam do longo caminho que a gente já traçou.
Como vocês criaram a ferramenta de arrecadação pela internet? É só um exemplo de como a gente pegou uma ideia tradicional de arrecadação de fundos e a usou. Há uma técnica de arrecadação de fundos muito comum nos Estados Unidos. Aqui, nós a chamamos de match e geralmente é usada como mala direta. Esses pedidos funcionam assim: "Se você der um dólar, há um outro doador que nos dará três dólares. Então, doe agora". A gente olhou para isso e pensou: as pessoas não acreditam nisso. Então vamos mudar essa ideia e vamos fazer ela incrivelmente transparente. O grassroots match faz isso.
Como funciona? Você manda um e-mail para sua base de arrecadação, pessoas que te doaram antes, e diz: "Ei, vamos falar com todas as pessoas que são nossos apoiadores, mas que nunca doaram antes. Vamos dizer: Nós temos 10 mil pessoas que darão 10 dólares, se você der 10 dólares hoje. E assim que você der os seus 10 dólares, a gente vai te conectar a uma dessas pessoas e você vai trocar impressões sobre a doação?." Nós descobrimos que as pessoas adoram fazer esse tipo de conexão, mesmo que elas não se conheçam. E elas voltam para doar 3, 4, 5 dólares. A campanha arrecadou muito dinheiro com pequenas doações. Então, focar nisso, foi uma parte importante da campanha.
O eleitor da internet tem um perfil específico? Não, na verdade, a gente descobriu que os perfis mais ativos usando os sites eram de pessoas que a gente não esperaria. Um dos enganos mais comuns que você costuma ouvir é que a internet é usada para convencer, persuadir as pessoas. Realmente tem, sim, alguma porcentagem de pessoas que vai ao site para aprender mais sobre o candidato. Mas ela serve, principalmente, para aumentar o entusiasmo e a paixão dos apoiadores e pedir a eles para fazer coisas, usá-los para falar com as famílias e os amigos para, aí sim, convencê-los e fazê-los mudar de ideia.
O senhor acha que a internet, ao dar transparência às doações, pode coibir casos de corrupção? Eu acho que ser capaz de financiar uma campanha política ou partido político (pela internet) é genial. É muito mais importante ter várias pessoas por aí espalhadas, apoiando um determinado candidato e se engajando na democracia. Isso deve ser encorajado. As doações pela internet são um jeito de fazer isso. Permitem que mais gente, e de forma mais fácil, se envolva com as doações. Toda vez que puder diminuir barreiras e aumentar participação em democracia é uma boa coisa.Aqui no Brasil estamos discutindo regulação de campanhas na rede.
O sr. é a favor de regular a internet? É muito difícil falar sobre isso, sem saber detalhes da situação.
Os partidos brasileiros estão cortejando o sr. Já fechou com alguém? Não comentamos nada sobre isso. Me desculpe.
Quem é:Ben Self É ex-diretor de tecnologia do Partido Democrata dos Estados Unidos e sócio-fundador da agência Blue State DigitalCoordenou a campanha online de Barack Obama. Ajudou a formatar a estratégia de arrecadação de doações para a campanha de Obama pela internet

Nenhum comentário: