segunda-feira, 24 de agosto de 2009

7ª ENTREVISTA: FLÁVIO LAPA CLARO

1) Você colocou no blog INVESTIGADOR DE POLÍCIA a frase: "Quando alguém está em perigo, pensa em Deus e clama pela Polícia. Passado o perigo, se esquece de Deus e execra a Polícia?. O que você quis dizer? Flávio Lapa Claro - Essa frase é o retrato do entendimento da população paulista sobre o papel representado pela Polícia no Estado de São Paulo. Na época da Ditadura (ou Ditabranda, segundo alguns partícipes) alguns setores da Polícia foram utilizados pelo Governo Militar como um dos braços da repressão. Foram criados os DOPS ou DEOPS, que, devido às circunstâncias da época, passaram a dominar a instituição, apesar de grande parte dos profissionais não tomarem parte das ações preconizadas por esses órgãos nem serem integrantes de seus quadros, e, muitas vezes, discordarem de forma absoluta da sua existência. Desde então as instituições policiais passaram a ser vistas como truculentas, brutais, cujas únicas técnicas de combate ao crime eram baseadas na tortura e na arbitrariedade, conceito esse baseado na generalização que foi feita com base nas ações de alguns setores das instituições, ações essas que em NENHUM MOMENTO foram diretrizes para a maioria dos policiais. Como não me canso de afirmar, a generalização é a base primeira para a formação de preconceitos. E foi o que aconteceu: a sociedade, com base nas informações recebidas de uma imprensa absolutamente parcial, não conseguiu perceber que agrande maioria dos policiais nunca agiu da mesma forma que aqueles grupos, e se formou o preconceito do qual hoje somos vítimas, apesar de tanto tempo decorrido, apesar de todas as mudanças havidas desde o fim daqueles tempos negros.

Reputo como grande responsável por esse preconceito a mídia em geral. Não conhecem limites para alcançarem seus objetivos. Denigrem a imagem de pessoas e de instituições, provocam traumas sociais, não se preocupam com as possíveis repercussões de notícias totalmente tendenciosas ou análises de fatos sem qualquer conhecimento de causa.

Fico revoltado cada vez que ouço as enormes BESTEIRAS que os chamados "analistas de segurança" de algumas emissoras de televisão fazem questão de proclamar como verdades absolutas. E sempre em prejuizo dos bons profissionais que existem nas instituições policiais – e que são a grande maioria. A impressão que tenho quando ouço esses luminares da imbecilidade comentando fatos que envolvem a Polícia é que eles acreditam que o Policial não é um Ser Humano. Que qualquer policial é capaz de levar 64 tiros, e mesmo assim correr quilometros atrás dos ladrões que o balearam, prendê-los ou matá-los todos, sem causar qualquer dano ao patrimônio ou à saúde de terceiros, salvar a mocinha e ainda ganhar um beijo sublingual quando está na maca aguardando pacientemente que os paramédicos o levem para o hospital, de onde sairá com dois curatívos 50 minutos depois de ter sido atendido pelo serviço de emergência. APESAR dos 64 tiros. Para a mídia, o Policial não é um ser humano comum. Não precisa se alimentar, não precisa usar o banheiro, não tem vida pessoal com que se preocupar, não tem medo, não fica gripado, nem cansado, nem estressado. NÃO PODE ERRAR, em nenhuma hipótese. Sendo que quem determina o que é certo ou errado, nesses casos, é o órgão do PiG que está analisando a ação noticiada, não é o que a Lei manda, mas o que o "repórter" julga ser certo. Enfim, aquela frase no blog é um PROTESTO contra o preconceito criado pela mídia e abraçado pela sociedade paulista contra os policiais civis e militares, que sinto na pele todos os dias e em qualquer circunstância.

2) Como são tratados os policiais civis e militares pelo governador de São Paulo, o tucano José Serra? Vocês ganham bem para exercerem as suas funções? Flávio Lapa Claro - Quando o ex-governador Fleury (PMDB, na época) deixou o Governo do Estado de São Paulo, achávamos que tínhamos alcançado o fundo do poço, e que pior do que estava seria impossível. Os sucessivos governos do PSDB demonstraram, no entanto, que aquilo que pensávamos ser o fundo do poço na realidade era apenas o início de um grande depósito de matéria fecal, onde fomos enfiados e no qual estamos afundando cada vez mais.O Estado mais rico do Brasil paga para os seus policiais o Pior Salário do Brasil. Descumpre a Constituição, atulhando o hollerit de adicionais disso ou daquilo, não extensivos aos nossos aposentados. E mesmo com todos os tais adicionais, conseguimos ainda permanecer com o título de policiais com os salários mais baixos da União.

Mas não estamos sozinhos nessa desgraça. Os profissionais da Educação e da Saúde estão junto conosco, naquela massa de matéria fecal.

Funcionário Público, para o PSDB, não passa de uma desperdício de dinheiro público, uma despesa a ser diminuída cada vez mais, se não for possível suprimí-la totalmente.O Governador José Serra conseguiu levar esse conceito a patamares nunca antes imaginados. Após a nossa greve do ano passado ter sido considerada ilegal pelo Ministro Eros Grau, e ter sido por este determinada a nossa volta ao trabalho, não tivemos condições de continuarmos a utilizar aquela arma para reivindicarmos melhorias salariais e de condições de trabalho. Aí o Governador aproveitou. Acredite se quiser: com os reajustes "concedidos" (6,5%, depois de quase 15 anos sem qualquer reajuste sério), alguns colegas tiveram seus vencimentos DIMINUÍDOS !!! Dá para entender ? Dá para aceitar ?O único resultado favorável, a meu ver, de todo o nosso movimento reivindicatório do ano passado foi a obtenção da exigência de diploma de nível superior para ingresso nas carreiras de Investigador de Polícia e Escrivão de Polícia.

Pois bem: hoje os integrantes dessas duas carreiras, que exigem nível universitário, têm salários inferiores aos integrantes de outras carreiras da mesma Polícia Civil que exigem diploma de segundo grau, como, por exemplo, agente de telecomunicações policial, papiloscopista policial, etc. ...No início de agosto foi publicado edital de abertura de concurso para ingresso na carreira de Investigador de Polícia, já com a exigência de diploma de nível superior. O TOTAL DE VENCIMENTOS informado no edital é de R$ 2.182,52 (dois mil cento e oitenta e dois reais e cincoenta e dois centavos). Ocorre que neste total está incluído o Regime Especial de Trabalho Policial (RETP), que costumamos chamar de "o salário da morte". Esse RETP proíbe o Policial de ter outras atividades remuneradas, inclui o adicional de periculosidade, estabelece regimes de plantão e a possibilidade de chamadas a qualquer momento. Ou seja, R$ 2.182,52 para trabalhar 24 horas por dia, sete dias por semana, ao bel-prazer da administração, SEM carga horária definida, sem percepção de horas-extras, e sem outras instituições comuns a qualquer trabalhador em qualquer outra atividade. O resultado foi que tiveram que dilatar o prazo para as inscrições, creio eu que por falta de interessados.

Nosso "plano de saúde" é o IAMSPE, que se resume ao Hospital do Servidor Público Estadual, na Capital, e alguns convênios no interior. Acontece que o Hospital do Servidor Público Estadual mantém convênio com o SUS. O resultado é simples: ou pagamos um plano de saúde privado ou nos submetemos a aguardar, às vezes, até 6 meses para conseguirmos uma consulta ou um exame. Como funcionários públicos, não participamos do FGTS. E a política de pagamento de adicionais não extensivos aos aposentados simplesmente subtrai dos vencimentos do policial, quando esse se aposenta, o valor desses adicionais, que, em alguns casos, representa mais que 25% do total percebido. E com os salários recebidos é impossível fazermos uma poupança para lançarmos mão quando nos aposentarmos. Resumindo: estamos ferrados quando na ativa, mais ferrados ainda ao nos aposentarmos.Poderia falar sobre outras coisinhas mais, como o vale-alimentação, por exemplo. Mas creio que o exposto já dá uma boa idéia de como nós, policiais, somos tratados pelo PSDB e pelo Governador José Serra.

3) No ano passado (2008), ocorreu uma manifestação promovida pelos policiais civis diante do Palácio dos Bandeirantes, quando ocorreu um confronto com os policiais militares. Qual era o objetivo daquela manifestação e quem mandou ao Comando da Polícia Militar aquela batalha lastimável? Flávio Lapa Claro - Em janeiro do ano passado iniciamos um movimento para reivindicar melhorias salariais e de condições de trabalho. Tentamos de todas as formas dialogar com o Governo, mas todas as nossas tentativas foram frustradas, tanto pelo Governador quanto pelos seus Secretários, em especial pelo Secretário de Gestão Pública, Dr. Sidney Beraldo. Não restando alternativa, decidimos entrar em greve.O Ministério Público do Trabalho, sabiamente, provocou, no TRT da segunda região, um julgamento de dissídio coletivo.O Governo do Estado, ao perceber que seria derrotado - segundo nota da Procuradoria Regional do Trabalho - recorreu ao STF, alegando a incapacidade do TRT para julgar matéria envolvendo funcionários públicos, e foi atendido em sua pretensão pelo Ministro Eros Grau, que remeteu o julgamento ao Tribunal de Justiça de São Paulo. Que seja do meu conhecimento, até hoje - mais de um ano depois - ainda não houve o julgamento. De qualquer forma, entramos em greve. Fizemos inúmeras manifestações, TODAS ELAS com o intuito de conseguirmos abrir um diálogo com o Governo, para conseguirmos EXPOR e DISCUTIR as nossas reivindicações, mas mesmo em greve em nenhum momento fomos atendidos. Decidimos, então, tentar entregar a nossa pauta de reivindicações diretamente para o Governador do Estado, e fizemos uma concentração nas proximidades do Palácio dos Bandeirantes, pedindo para que uma comissão de nossos representantes pudesse ter acesso ao Palácio para protocolar o documento e tentar discutir o assunto com alguém responsável. Por telefone nos foi avisado que o Governador receberia uma comissão, conforme proposto. Escolhemos os integrantes da comissão, que se dirigiram para o Palácio. No entanto, nossos representantes foram impedidos de prosseguir sua caminhada em direção ao seu objetivo pela Tropa de Choque da PM, cujo comandante alegou ter ordem do Governador para impedir o acesso da comissão ao Palácio. Nenhuma argumentação foi suficiente para evitar tal abuso de autoridade. E foi aí que aconteceram aquelas absurdas cenas de horror.Cabe ressaltar que o Inquérito Policial instaurado para estabelecer as responsabilidades concluiu que a culpa do conflito foi do Governador José Serra.

4) Há manipulação pelo Governo José Serra em relação à violência no Estado de São Paulo? É verdade que os policiais civis e militares cometem muitos suicídios? Flávio Lapa Claro - As Polícias do Estado de São Paulo deixaram de ser instrumentos do Estado e se tornaram instrumentos do Governo. São usadas pelo Governador de Plantão para implementar os seus objetivos, não para cumprirem as suas funções institucionais de Polícia Preventiva, Polícia Judiciária e Polícia Administrativa. Cada vez que existem mudanças nos números das estatísticas e a imprensa noticia, a administração desmonta o que está funcionando bem para tentar fazer o que está funcionando mal passar a funcionar. Ou seja, descobrem os pés para cobrirem a cabeça. Eu, particularmente, não consulto os números referentes à criminalidade no Estado. Se o fizer, muito provavelmente tomarei decisões erradas. Se bem que a atual administração parece estar levando isso mais a sério e com maior transparência. Mas ainda estamos no estágio em que o Estado nega a existência do PCC, ou minimiza sua capacidade de causar danos. O último exemplo disso ocorreu na semana passada: Agentes penitenciários interceptaram uma carta da liderança do PCC a todos os "afiliados", determinando uma série de ações dentro e fora dos presídios. Da última vez que isso ocorreu, segundo o que me foi informado, a Secretaria da Administração Penitenciária tomou conhecimento do documento mas não lhe deu o tratamento devido, o que resultou na morte de centenas de profissionais da Segurança Pública, tomados de surpresa pelas ações que nunca mais esqueceremos. Um agente penitenciário, percebendo a possibilidade do fato se repetir, divulgou o teor do documento, enviando cópia para diversas pessoas e autoridades. Com a publicidade dada, a rebelião foi abafada - E O AGENTE PENITENCIÁRIO PROVAVELMENTE SERÁ PUNIDO PELA ADMINISTRAÇÃO...Quanto à incidência de suicídios, sei que é grande, mas não tenho informação suficiente para poder comparar com as outras áreas de atividade.

5) Faça um diagnóstico do período dos Governos Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra em São Paulo. Flávio Lapa Claro - Foi implementada uma política de incapacitação total das Polícias para o desempenho de suas funções. Valorizaram exclusivamente a visibilidade, sem se preocuparem com os resultados. E estes não resistem a qualquer análise séria que se faça, de tão ridículos que são.Faz pouco tempo a midia publicou com estardalhaço que a Polícia Civil esclarece menos que 4 % dos crimes ocorridos no Estado. Em números relativos pode parecer um absurdo, mas em números absolutos ficaríamos surpresos com a ENORME QUANTIDADE DE CRIMES esclarecidos.A incapacidade da Polícia Militar em fazer uma prevenção eficaz, sejam quais forem os motivos, que impeça os crimes de acontecerem, reflete no desempenho de todo o sistema policial e judiciário. Não há efetivo capaz de dar conta de tamanha quantidade de trabalho.Além disso, os salários e as condições de trabalho não atraem os mais capazes para a profissão. Isso gera algumas distorções altamente prejudiciais: os que se sujeitam às condições dadas pelo Estado ou são absolutamente vocacionados - o que é bom - ou aqueles que querem usar a Polícia para outros objetivos - o que é péssimo.Há que se reformular totalmente a política de segurança pública do Estado. O PSDB comprovou, através dos últimos 3 ocupantes do Governo do Estado de São Paulo, que não faz idéia do que seja Segurança Pública, nem o que fazer para cumprir com a obrigação do Estado de prover Segurança para o cidadão.

6) Comente a ação do governador José Serra contra o blog FLIT PARALISANTE. Flávio Lapa Claro - Qualquer cidadão que julgue ter sido sua honra atingida pode - e deve - buscar reparação pelos danos sofridos. No entanto, as pessoas que ocupam cargos públicos devem saber distinguir o que é uma disputa política e um ataque pessoal.Não tive acesso aos autos do processo em que José Serra se diz vítima de crimes contra a honra, cujo autor seria o Dr. Guerra. Portanto, não tenho como emitir opinião a respeito.Mas o que causou espécie foram as circunstâncias em que toda a polêmica se deu. Estavamos em greve, e o Flit Paralisante tinha se tornado o principal meio de comunicação, debates e decisões dos grevistas. Exatamente neste momento o blog é retirado do ar devido a suposto crime contra a honra do Governador. Na minha forma de ver, o ato foi de uma truculência incomparável. O Juiz não se limitou a determinar a supressão do artigo supostamente ofensivo, mas do blog inteiro. Além disso, determinou que a Google NUNCA MAIS HOSPEDASSE QUALQUER BLOG do Dr. Guerra. Mesmo que o tema tratado fosse a vida e a obra da Madre Teresa de Calcutá e sua relação com os ensinamentos de Gandhi.Não sou bacharel em direito, mas todo o meu instinto me diz que isso se chama CENSURA, e que afronta o Art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil. Posso estar enganado, mas até agora ninguém conseguiu me convencer do contrário.E se meu instinto estiver certo, alguém sabe me explicar o que levaria um Juiz de Direito a cometer tamanha arbitrariedade? Será que ele agiria de outra forma se o reclamante não fosse o Governador do Estado, ou se nós não estivessemos em greve, ou se o Flit Paralisante não estivesse sendo utilizado em favor dos grevistas? Tenho certeza que sua decisão seria diferente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: Enquanto a Polícia for utilizado como instrumento político, enquanto a política for a principal diretriz das decisões sobre a Polícia, a população estará sendo suprimida do seu direito constitucional à Segurança Pública. O PSDB e seus associados implantaram, no Estado de São Paulo, uma política de EXTINÇÃO dos serviços públicos essenciais: a Educação, a Saúde e a Segurança Pública. Querem que a população se dane. Desde que Mário Covas assumiu o Governo do Estado de São Paulo esses serviços essenciais foram relegados a um vigésimo plano. São 15 anos sem reajustes salariais, de desprezo com o funcionalismo público, de sucateamento das instituições, da opção pelo que é visível em desfavor do que é necessário para a população e obrigação do Estado.

A população, sofrida, quer e tem direito a serviços públicos de qualidade, mas não os obtém. A mídia, absolutamente subjugada, parcial e com objetivos muito claros, forma a opinião que os responsáveis por todas as mazelas são os funcionários que deveriam prestar esses serviços, impedindo uma análise mais aprofundada que revelaria claramente que a falência dos serviços essenciais se deve exclusivamente à vontade política daqueles que estão no Poder.Em 2010 teremos a oportunidade de começar a mudar essa situação. Espero sinceramente que a população do Estado de São Paulo consiga fazer uma análise crítica da atuação do PSDB no Governo do Estado, e que DEFENESTRE todos os candidatos desse partido e de seus associados de TODOS os cargos eletivos do país, para que possamos ter condições minimamente dignas de VIDA, EDUCAÇÃO, SAÚDE E SEGURANÇA.PSDB NUNCA MAIS. Flávio Lapa Claro - Investigador de Polícia.

Nenhum comentário: