sexta-feira, 19 de março de 2010

Paz no Oriente Médio?

Por José Dirceu: A visita de dois dias que o presidente Lula fez nesta semana a Israel foi importantíssima sob vários aspectos.
“É preciso reconhecer a importância e o valor histórico da visita a Israel” e ter clareza de que a viagem “servirá para aumentar seu prestígio internacional e consolidar a credibilidade conquistada pelas políticas de inclusão social, aumento da renda, retomada do desenvolvimento e melhoria do nível do emprego no Brasil”.
As aspas não são minhas, mas do presidente da Conib (Confederação Israelita do Brasil), Cláudio Lottenberg, médico que preside também a Sociedade Beneficente Israelita Brasileira, instituição mantenedora do Hospital Albert Eistein.
Antes de qualquer análise, a visita de Lula a Israel é histórica por ser a primeira vez que um presidente brasileiro vai à região. O último chefe de Estado brasileiro a pisar em Israel foi, pasmem!, o imperador Pedro 2º, em 1876.
Ao invés de valorizar o feito e a importância do estreitamento das relações com os países do Oriente Médio, nossa mídia e alguns articulistas preferiram o caminho da crítica a partir de uma versão parcial sobre a região.
Um dos pilares desse caminho enviesado foi a questão delicada do Irã e da transformação do seu presidente, Mahmoud Ahmadinejad, e da nação da antiga Pérsia em ameaça ao Ocidente, à sua segurança e civilização.
Nesse diapasão, o reconhecimento internacional do papel que o Brasil tem exercido fica em segundo plano. Nosso país, a partir de uma nova diretriz na política externa encampada pelo governo Lula, tem trabalhado a partir da compreensão de que é preciso reforçar o caráter multipolar da nova ordem internacional.
Esse caminho tem potencializado o Brasil como interlocutor qualificado na busca de uma solução pacífica que preserve, de um lado, o Estado de Israel que o Brasil ajudou a criar na ONU (Organização das Nações Unidas), em 1948 —um direito do povo judaico—, mas que também possibilite, de outro lado, a criação de um Estado da Palestina —igualmente um direito do povo palestino e um dever internacional. Tal saída diplomática permitirá ainda um desenlace positivo na questão nuclear iraniana.
O fortalecimento do papel brasileiro se dá na compreensão das especificidades de cada nação. Não se pode esquecer que Israel e o Irã são sociedades onde a religião predomina sobre o laicismo do Estado. Tampouco que Israel não cumpre as resoluções da ONU e que, há décadas, ocupa territórios que deveriam ser palestinos, onde constrói colônias, fazendo da guerra de agressão ao povo palestino um objetivo nacional e mantendo um caráter expansionista que pauta uma guerra permanente contra os árabes.
Há anos também que os EUA, preocupados só com seus interesses, atuam em favor apenas de Israel. Os norte-americanos implementam uma política externa de estímulo ao belicismo que cria dificuldades para a paz na região. O pretexto sempre é o de condenar as violações dos direitos humanos e da democracia nos países próximos a Israel, como o Irã e o Iraque.
Nesse contexto, a passagem do presidente Lula por Israel, seguida de encontros com lideranças palestinas, pode ajudar a criar um outro espaço de negociação, no qual a hegemonia da coalizão entre os norte-americanos e o sionismo seja contraposta por um bloco de nações efetivamente dispostas a construir uma chance para a paz, com base na convivência sustentável e soberana de dois Estados e dois povos, israelitas e palestinos. José Dirceu, 64, é advogado e ex-ministro da Casa Civil

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