Carta Maior: Entre o bombom de cupuaçu e o bafômetro
O excelente Quanto Tempo Dura? brincou: e se fosse o Lula? E se o Lula tivesse se recusado a passar pelo teste do bafômetro? E se o Lula tivesse levado sete pontos na carteira e tomado a multa — que equivale a de alguém que dirige alcoolizado?
por Luiz Carlos Azenha
A Carta Maior levou o desafio ao pé da letra e foi buscar um exemplo de como a Folha de S. Paulo se comportou em uma situação muito menos grave que envolveu Lula: o caso do bombom de cupuaçu.
Escreveu a Carta, em texto que se tornou viral na rede:
O excelente Quanto Tempo Dura? brincou: e se fosse o Lula? E se o Lula tivesse se recusado a passar pelo teste do bafômetro? E se o Lula tivesse levado sete pontos na carteira e tomado a multa — que equivale a de alguém que dirige alcoolizado?
por Luiz Carlos Azenha
A Carta Maior levou o desafio ao pé da letra e foi buscar um exemplo de como a Folha de S. Paulo se comportou em uma situação muito menos grave que envolveu Lula: o caso do bombom de cupuaçu.
Escreveu a Carta, em texto que se tornou viral na rede:
Sem dúvida o aspecto mais chocante no episódio da blitz da Lei Seca, no Rio, que flagrou Aécio Neves dirigindo com habilitação vencida e metabolicamente impossibilitado de soprar o bafômetro, não foi o fato em si , mas o comportamento da mídia demotucana. Os blindados da ‘isenção’ entraram em cena para filtrar o simbolismo do incidente, ‘um episódio menor’, na genuflexão de um desses animadores da Pág 2 da Folha. Menor? Não, nos próprios termos dele e de outros comentaristas do diário em questão. Recordemos. Em 24 de novembro de 2004, Lula participou da cerimônia de inauguração de turbinas da Usina de Tucuruí, no Pará. No palanque, sentado, espremido entre convidados, o presidente comeu um bombom de cupuaçu, jogou o papel no chão. Fotos da cena captada por Luiz Carlos Murauskas, da Folha, saturaram o jornalismo isento ao longo de dias e dias. Ou melhor , anos e anos. Sim, em 2007, por exemplo, dois colunistas do jornal recorreriam às fotos de Tucuruí para refrescar o anti-petismo flácido do eleitor que acabara de dar um novo mandato a Lula. O papel do bombom foi arrolado por um deles como evidencia de que o país caminhava a passos resolutos para a barbárie: “Só falta o osso no nariz’, arrematava Fernando Canzian (23-07-2007) do alto de sofisticada antropologia social. Sem deixar por menos, Fernando Rodrigues pontificaria em 09-04-2007: “…Respira-se em Brasília o ar da impunidade. Valores republicanos estão em falta. Há exemplos em profusão (…) em 2004, Lula recebeu um bombom. … O doce foi desembrulhado e saboreado. O papel, amassado. Da mão do petista, caiu ao chão. Lula seguramente não viu nada de muito errado nesse ato. Deve considerá-lo assunto quase irrelevante. …Não é. No Brasil é rara a punição -se é que existe- para pequenas infrações como jogar papel no chão. Delitos milionários também ficam nos escaninhos do Judiciário anos a fio (…) Aí está parte da gênese do inconformismo de alguns, até ingênuos, defensores de uma solução extrema como a pena de morte. Gente que talvez também jogue na calçada a embalagem do bombom de maneira irrefletida. São “milhões de Lulas”, martelava o jingle do petista. São todos a cara do Brasil…” (Carta Maior; Domingo, 24/04/2011)
Colaborando com a curiosidade de vocês, reproduzo na íntegra os dois textos em que os colunistas pontificam sobre Lula, o tosco:
Pena de morte e poucos valores
Por Fernando Rodrigues, na Folha de S. Paulo, em 09.04.2007
BRASÍLIA – Subiu para 55% o apoio à pena de morte. Desde 1993 o Datafolha não registrava tal marca. Essa adesão ao medieval “prenda e arrebenta” é de origem difusa. Mas a inação dos políticos tem razoável culpa no cartório. Um dos fatores mais inibidores do crime não é o tamanho da pena, mas a inevitabilidade da punição.
Nesse quesito, os políticos produzem contra-exemplos em série. Deputados e senadores cometem crimes. Renunciam para escapar da punição. Voltam reeleitos. Seus colegas se comportam como se nada tivesse ocorrido.
Respira-se em Brasília o ar da impunidade. Valores republicanos estão em falta. Há exemplos em profusão. Um caso já antigo é emblemático pela singeleza do ato e pelo protagonista envolvido. Em uma de suas andanças já como presidente, em 2004, Lula recebeu um bombom. A mídia captou a cena. O doce foi desembrulhado e saboreado. O papel, amassado. Da mão do petista, caiu ao chão.
Lula seguramente não viu nada de muito errado nesse ato. Deve considerá-lo assunto quase irrelevante. Se alguém o menciona, o petista possivelmente classificará a crítica como firula, preconceito. Não é.
No Brasil é rara a punição -se é que existe- para pequenas infrações como jogar papel no chão. Delitos milionários também ficam nos escaninhos do Judiciário anos a fio.
Malufs podem até amargar uns dias de cadeia, mas logo estão por aí, leves e soltos, desfrutando de foro privilegiado. Já pobres diabos vão para a cadeia por furtarem um frasco de xampu no mercado. Aí está parte da gênese do inconformismo de alguns, até ingênuos, defensores de uma solução extrema como a pena de morte. Gente que talvez também jogue na calçada a embalagem do bombom de maneira irrefletida. São “milhões de Lulas”, martelava o jingle do petista. São todos a cara do Brasil.
23/07/2007
Elites [Ilustrada com a foto de Lula e o papel no chão, entre outras]
por Fernando Canzian, na Folha de S. Paulo
Em 1994, o escritor e crítico cultural norte-americano William Henry 3º (morto aos 50 um ano depois) lançou nos EUA “In Defense of Elitism” (Em Defesa do Elitismo), um livro deliberadamente provocativo que fez um bom barulho na “nação mais igualitária do mundo”, como a América gostaria de ser.
Em resumo, Henry argumentava que na luta perpétua entre o igualitarismo e o elitismo, o primeiro vinha ganhando de lavada nas últimas décadas nos EUA.
De maneira provocativa, dizia que não estava defendendo nenhuma elite específica, mas a “idéia de excelência”, que ele julgava ter sido abandonada ao longo do caminho em busca de uma “sociedade mais igual”.
“Algumas idéias são melhores do que outras. Alguns valores, mais duradouros. Alguns legados, mais universais”, escreveu Henry. Se autodefinindo como um “antiquado meritocratra”, afirmava que a sociedade americana de seu tempo vinha “gastando mais tempo e energia para consolar perdedores do que para incentivar vencedores”.
Uma máxima do livro, comparando uns e outros: “Não é a mesma coisa conseguir colocar um homem na Lua ou apenas ser capaz de andar com um osso enfiado no nariz…”.
Não sei o que Henry diria de nossas elites, principalmente a política, nos últimos tempos. A “elite” petista no comando desse governo é um glorioso desastre como exemplo, idéia de excelência e valores, sem falar em falta de educação e sensibilidade.
Encastelado em seu “sucesso” econômico atual, o governo parece ter perdido a noção da realidade, o bom senso. É patético assistir assessores especiais da Presidência e ministros fazendo gestos obscenos ou usando expressões ridículas enquanto milhares sofrem (e centenas morrem) na tal crise aérea que não tem mais fim.
O PT sempre se arvorou de ser um partido correto, o mais ético da cena nacional, até a crise do mensalão acabar com essa lorota. Depois da limpa inicial, dos Delúbios endinheirados e Silvinhos corrompidos por carrões usados, sobrou agora, no comando, talvez “a melhor elite” do PT. É o que temos. Só falta o osso no nariz.
PS do Viomundo: Quanto à pena de morte, citada pelo Fernando Rodrigues, ela existe no Brasil. Foi praticada, por exemplo, no massacre de Eldorado dos Carajás. A isso, sim, podemos chamar de impunidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário