quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Marcos Coimbra: "Prevaleceria a versão que a chamada “grande imprensa”

Marcos Coimbra Sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi
A política e as pesquisas
Mesmo que satisfeito, objetivamente, com Dilma (como tinha estado com Lula), o cidadão talvez hesitasse em dizê-lo, imaginando que estava isolado e que só ele tinha uma boa opinião do governo.
As pesquisas de opinião a respeito de temas políticos e governamentais são parte de nossa cultura desde o fim da ditadura militar. Não que inexistissem antes, pois elas chegaram ao Brasil ainda no começo dos anos 1950. Mas seu uso só se difundiu e se consolidou após a redemocratização.
Ao longo da década de 1980, passaram de coadjuvantes, com importância às vezes secundária, a um papel mais central. Seja nas eleições, seja na aferição dos sentimentos da população, tornaram-se elemento habitual no debate das questões nacionais.

Nas primeiras eleições diretas para governador, em 1982, chegaram a ser decisivas em, pelo menos, um lugar. No Rio de Janeiro, se não houvesse (muitas) pesquisas apontando que a maioria do eleitorado pretendia votar em Leonel Brizola, talvez tivesse se consumado uma fraude contra ele, pelo que ficou aparente durante a apuração.
O tristemente célebre caso Proconsult, de uma empresa contratada para fazer a totalização dos votos e que iria beneficiar o candidato do PDS — o preferido dos militares, da elite carioca e do sistema Globo de comunicação — só veio à tona pela inverossimilhança dos números que começaram a ser divulgados, face a expectativa gerada pelos resultados disponíveis. Não deixa de ser curioso que um político que se tornou, mais tarde, um notório descrente das pesquisas, tivesse vencido sua primeira eleição depois do exílio ajudado por elas.
Em que pese uma história de quase 30 anos, o sistema político tem uma relação ambígua com as pesquisas. Quer seja entre profissionais do ramo ou na imprensa, predomina um sentimento de que são uma espécie de “mal necessário”, algo que precisa ser usado, mas só na hora em que é inevitável.
Quando chega esse momento, no entanto, mais que uso, temos abuso. É o que ocorre nos períodos eleitorais, especialmente na época das eleições para presidente e governador. Nos meses que as antecedem, a discussão política e o noticiário se afunilam tanto que só se fala nelas na véspera.
Fora dessas oportunidades, o sistema consome muito menos pesquisas que o padrão internacional. Os veículos de comunicação, de âmbito nacional ou regional, prescindem delas na cobertura política, talvez por julgar que o ponto de vista da opinião pública não é tão relevante. (Há quem diga que o problema é apenas a falta de dinheiro, mas não parece uma hipótese provável, pois, se a mídia considerasse importante o investimento, a verba não faltaria.)
Em um ano não eleitoral como este, a opinião pública só conhece os resultados de três ou quatro pesquisas nacionais contratadas por órgãos de imprensa. Outras são custeadas por organismos de representação patronal, com intervalos longos e, nem sempre, regulares, o que faz com que alguns suspeitem de que são encomendadas ao sabor dos interesses de seus dirigentes.
Nosso padrão para com as pesquisas é marcado, portanto, pelo excesso e a falta: ora pesquisas demais, ora de menos. São superabundantes nas eleições e escassas no restante do tempo.
Apesar disso, desempenharam papel fundamental no jogo político dos últimos anos, particularmente da metade do segundo mandato de Lula até o presente.
Se, nestes primeiros meses de governo Dilma, não tivéssemos as (poucas) pesquisas que temos, o clima político seria completamente diferente. Sem elas (como a mais recente do Ibope, que mostrou que a avaliação de Dilma estava em ascensão), sem saber que a presidente conta com a aprovação da vasta maioria do país, o que estaria acontecendo?
Prevaleceria a versão que a chamada “grande imprensa”, imbuída da missão de derrotar o “lulopetismo”, apresenta diariamente. Mesmo que satisfeito, objetivamente, com Dilma (como tinha estado com Lula), o cidadão talvez hesitasse em dizê-lo, imaginando que estava isolado e que só ele tinha uma boa opinião do governo. Inversamente, as oposições suporiam que contam com o apoio da maioria.
Sem as pesquisas, Dilma não teria algo que Lula também teve, uma “âncora de popularidade”, necessária para construir e manter uma coalizão governativa nas condições institucionais vigentes. Se o Congresso só tivesse esses jornais e revistas para ler, sentiria-se no dever de providenciar o impeachment da presidente.
Elas são falíveis e sujeitas a muitas críticas. Mas, em um país como o nosso, as pesquisas acabam por contribuir, de forma nada irrelevante, para com a democracia.

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