domingo, 1 de setembro de 2013

PT no Ceará: Novidade em meio à desolação

É evidente o crescimento do desconforto da base petista com a política, até então majoritária, de conduzir o PT a alianças eleitoreiras e sem substância ideológica. Este é o sentimento de mudança que pode produzir uma virada política nos rumos do partido no país e, especialmente, no Ceará.
Texto de Rafael Tomyama* 
Até as castanholeiras do Cocó sabem que os destinos do PT e do PSB dos irmãos Ciro e Cid Ferreira Gomes seguem por rumos diferentes. Seja porque, do ponto de vista prático, os Gomes estejam prontos para aterrisar na candidatura de Eduardo Campos, seja porque fique cada vez mais evidente que seus interesses particulares se opõem frontalmente ao que o PT e a esquerda representam na restauração democrática brasileira.
Sim, porque os Gomes não governam com base num corte ideológico ou mesmo com um projeto político definido. Seu governo pode acomodar, convenientemente, uma coalizão de forças que vai da direita mais conservadora à esquerda moderada, sem o menor pudor. A única exigência é que se submetam ao seu comando. E assim vão cooptando com fisiologismo e subjugando um a um todos os "aliados".
Embora sempre tenha existido a contestação da aliança nas hostes petistas, a esta espécie de coronelismo reinventado, urbanizado, modernoso, tecnocrático, o quadro mudou quando o PT ousou escolher democraticamente como candidato para suceder a prefeita petista Luizianne, um companheiro não "ungido" pelos oligarcas: Elmano de Freitas (que, passada a eleição de 2012, agora é candidato a presidente do PT em Fortaleza).
Elmano não lhes devia o "favor" de ter sido designado para tal missão. Nem se propôs a ser mais um subalterno. Então veio a ruptura, operada pelos Gomes, embora quisessem posar de "vítimas" da "intransigência" petista. Lançaram o seu candidato biônico e praticaram todo tipo de jogo baixo, para "ganhar" a eleição por uma pequena margem de diferença.
Então, no PT, mais vozes se somaram às nossas, com a convicção de que esta forma de fazer política não interessa ao projeto emancipatório dos trabalhadores e das trabalhadoras.

Autocracia rima com coerência?
Mas a reprovação não está só entre petistas. É crescente o desgaste e a insatisfação da população com o mandonismo despótico dos irmãos Ferreira Gomes. A oligarquia (grupo familiar) oriunda de Sobral, na região Norte do estado, dá continuidade a um modelo concentrador de renda, de favorecimento a certos grandes negócios privados, aliado à distribuição de cargos e benesses de acordo com interesses eleitorais de aliados políticos. O Índice de Desenvolvimento Humano dos Municípios do Ceará é o 11º pior entre os estados do Brasil. Quem quiser conferir os dados do IDHM, vide o Atlas do Desenvolvimento Humano Brasil 2013, elaborado por: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Fundação João Pinheiro e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Os gastos inúteis na segurança pública, os questionamentos a obras faraônicas, o trato desrespeitoso com os movimentos sindicais e reivindicatórios em geral, os escândalos de uso patrimonialista da máquina pública, e até a contratação de um buffet milionário para as festividades palacianas, enquanto a maior seca dos últimos tempos assola o sertão cearense, têm provocado um estrago na aprovação do governo, conforme registram pesquisas de opinião pública.
Estes dados apenas evidenciam sua natureza pseudodemocrática e antipopular. Aliam-se à fração "esclarecida" da burguesia para presidir o aparato estatal a partir dos interesses do Centro Industrial do Ceará - CIC. Para tanto, utilizam-se da legenda do PSB (como já usaram o PMDB, o PSDB e o PPS), dentre outras (PRB, PSD), para compor uma ampla maioria parlamentar afável a seus desmandos.
O modo "democrático" do clã Ferreira Gomes é tão somente um método de cooptação de lideranças pela adulação, clientelismo e favorecimentos. Quando se deparam com a recusa, passam a perseguir e massacrar quem lhes critica. Abominam o pensamento crítico e apreciam um séquito de bajuladores.
Este quadro torna cada vez mais incongruente a presença do PT Ceará em cargos do governo e na aliança que lhe dá sustentação.
Do jeito que a gente gosta
Por isso mesmo, eis que da adversidade surge a novidade. A "cara nova" do PT velho de guerra é a candidatura de Guilherme Sampaio a presidente estadual do partido no Ceará. Guilherme é vereador do PT em Fortaleza e na bancada liderada pelo vereador Deodato Ramalho tem se destacado como uma das mais importantes vozes de oposição ao descalabro administrativo do PSB, do prefeito Roberto Cláudio, na Prefeitura de Fortaleza.
Guilherme conta com o apoio de várias lideranças, como: o Senador José Pimentel, o deputado federal Eudes Xavier e a ex-prefeita Luizianne Lins. Todos entendem como prioritária a reeleição da presidenta Dilma em 2014. Para tanto, mesmo que os Gomes resolvam abandonar o candidato de seu partido, Eduardo Campos (PSB) para apoiá-la, nada impede que o PT - que não lançou por duas vezes consecutivas para apoia-los - apresente agora candidatura própria ao governo estadual. Como aliás acontece com partidos aliados em outros estados, inclusive nos governados pelo PT.
E não seriam os vários palanques, e sim a ausência deles, o que poderia prejudicar a reeleição da companheira Dilma.
Para que o PT do Ceará possa estar a altura deste desafio, a Articulação de Esquerda (AE) está com Guilherme Sampaio. A AE avalia que o trabalho de formação e organização dos diretórios por todo estado é a nossa principal tarefa, visando fortalecer o partido para os embates da conjuntura.
Isto quer dizer que quem acha que a disputa interna já está "ganha" é quem considera os(as) filiados(as) do PT como massa de manobra de seus propósitos oportunistas. Quem pensa assim são os mesmos que prefeririam um PED de acordão, de "chapa única", para colocar as divergências "em baixo do tapete", sem debate e sem amadurecimento coletivo. Pensam sempre em seu próprio benefício somente. Mas não em nosso nome.
O PT não pode ficar refém de uma corrente que considera a sua autoconstrução exclusiva em detrimento do Partido. O chamado "campo democrático" sistematicamente realiza plenárias de sua tendência, mas sabota as atividades deliberadas pela direção do PT. Assim, coloca os interesses de seu pretenso candidato no ano que vem, acima dos objetivos do PT como um todo. Infelizmente, é isso que se observa no PT-CE e que não é muito diferente da prática da CNB em outras partes do Brasil.
Por isso mesmo, Guilherme representa a visão de um conjunto de forças que acredita que o PT deve retomar seu caráter contestador, irreverente e sintonizado com as lutas populares e das juventudes. Um PT presente nas escolas e universidades, nas fábricas, comércios e onde estiver, enfim, o povo trabalhador. Um novo tempo para retomar o PT de verdade é o lema da campanha que pretende reacender a esperança vermelha no meio da militãncia petista: "O PT do jeito que a gente gosta".
*Rafael Tomyama é dirigente nacional da AE e militante do PT no Ceará
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O Processo de Eleição Direta - PED, mecanismo instituído pelo PT por meio de regulamento congressual, para sucessão democrática de suas instâncias dirigentes, iniciou em todo país com as inscrições de candidatos e chapas (eleitas separadamente) nos níveis: nacional, estadual, municipal e zonal (onde houver).
No Ceará, as cinco candidaturas inscritas são apoiadas pelas seguintes forças: Guilherme Sampaio (Articulação de Esquerda, Democracia Socialista, Articulação Unidade na Luta, Casa Vermelha e Optei); Diassis Diniz (Democracia Radical, Movimento PT e Militância Petista); Zé Maria Castro (Militância Socialista, Esquerda Popular Socialista e Dep. Bruno); Eudes Baima (O Trabalho) e Antônio Ibiapino (TRS).
Acesse o site do PED 2013 e fique por dentro de tudo: http://ped.pt.org.br/
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Publicado no jornal Página 13 de setembro: http://www.pagina13.org.br/download/pag13_124_setembro_2013.pdf

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