Quem subestimou o petista Luiz Inácio Lula da Silva, em sua terceira tentativa de subir a rampa do Palácio do Planalto, não deve repetir argumentos gastos. Depois que ele se instalou na presidência da República, durante oito anos, conseguiu ainda eleger sua sucessora, a sua ministra Dilma Rousseff. Desdenhá-lo realmente não faz mais sentido, porque ele demonstrou que não tem nada de Sassá Mutema, um personagem caricato de folhetim da Rede Globo, estigmatizado por seus adversários, que se aproveitaram dele para fazê-lo de vilão.
No dia 14 de dezembro, quando faltavam 15 dias para Lula descer liturgicamente a rampa que ele subiu para assumir o poder, conquistado pelo voto, o presidente começou a se despedir da forma que ele mais sabe fazer, com discursos, sempre em sua forma coloquial, que mais parece uma conversa entre amigos. Neste dia, em viagem pelo Nordeste, sua região (ele nasceu em Pernambuco), Lula, embora emocionado, no município sertanejo de Salgueiro, que fica a 518km de Recife (PE), aproveitou para se deliciar, criticando as elites da região, ou seja, os antigos coronéis da política. Na ocasião, Lula manifestou o propósito de não vestir o “pijama” e se mostrou disposto a organizar a memória e a emoções que sentiu, convivendo com os homens mais poderosos do mundo, sendo reconhecido por seu colega Barack Obama como “o cara”.
Lula, na despedida em Pernambuco, avisou, em tom emocional: “Não verei vocês até ano que vem. Mas estejam certos de uma coisa: eu disputei eleições em 1989, 1994 e 1998 e perdi. E, a cada vez que perdia, eu não me escondia. Eu voltava para a rua. Depois, ganhei 2002, ganhei 2006. Elegemos a companheira Dilma, que pode fazer um governo melhor do que eu fiz. Se, quando eu perdia, eu não me escondia, por que vou me esconder agora que eu ganhei?”.
A ascensão de Lula começou a ser sinalizada em junho de 2002, quando a sua agenda já não comportava mais compromissos de presidenciáveis, mas sim de presidente da República eleito, quando sua presença era mais importante. Naquela época, ele simplesmente alegava compromissos familiares para justificar sua ausência em debate promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), com o propósito de ouvir suas propostas para o setor da construção. A razão, soube-se depois, para o desapontamento dos empresários foi, na verdade, que ele preferiu se ocupar diante das lentes dos fotógrafos de estrelas do nível de Vera Fischer e Luana Piovani, que naqueles anos faziam muito sucesso.
Metido em um bem cortado terno assinado por Bruno Minelli, um dos mais caros do país na época, ele fez poses para uma sessão de fotos encomendada pelo marqueteiro Duda Mendonça, que coordenava a imagem do então candidato. As fotografias seriam usadas na propaganda eleitoral a ser impressa.
Ou seja, não prosperou o esforço dos seus adversários em torná-lo Sassá Mutema, personagem vivido por Lima Duarte, em uma trama ambientada em duas cidades fictícias (Tangará e Ouro Verde). O personagem era um boia-fria, agricultor que trabalhava em diversas lavouras, mas não tinha a sua. Ou seja, estimulada ou não, muita gente via uma certa semelhança entre o personagem e o operário na vida real, porque na época ele não dominava a língua portuguesa falando ou escrevendo.
Durante uma viagem à Venezuela, em julho de 2003, já assimilado ao poder, Lula, durante um encontro com o seu colega Hugo Chávez, tocando um violino, ele reacendeu a teoria atribuída ao general Juan Domingo Perón, ao conquistar o governo da Argentina (“O poder é como o violino, toma-se com a esquerda e toca-se com a direita”). Logo depois, o presidente brasileiro, durante uma entrevista coletiva, falou sobre o seu passado sindicalista e afirmou que nunca admitiu que o rotulassem como esquerdista. Toda essa pressa em esclarecer posições ideológicas se devia ao fato de ser citado pela mídia como um estadista de esquerda. Ele tratou de mostrar sua posição: “Em toda a minha vida, nunca gostei de ser rotulado de esquerda. E, na primeira vez que me perguntaram se eu era comunista, respondi-lhes: ‘Sou torneiro mecânico!’”.
Com o tempo, Lula foi absorvendo o lado leve do poder, tornando-se um globe-trotter, fazendo viagens internacionais. Em setembro de 2003, ele fez sua estreia na ONU, abrindo a 58ª Assembleia Geral, com um pronunciamento cuja frase de efeito foi o “caminho da paz é o combate à fome e à miséria, numa formidável campanha de solidariedade capaz de unir o planeta em vez de aprofundar divisões e os ódios que conflagram os povos e semeiam o terror”.
Mas, cautelosamente, diante de um George W. Bush, que se encontrava no plenário ouvindo seu pronunciamento, evitou citar os Estados Unidos ao atacar a política americana, evitando passar por cima da ONU e das instituições internacionais: “Pode-se até vencer uma guerra isoladamente, mas não se pode construir paz duradoura sem o concurso de todos. A ONU não foi concebida para remover os escombros dos conflitos que não pôde evitar”. De uma forma ou de outra, alfinetou Bush sutilmente.
Quando ele já havia consumido 26 meses de seu primeiro mandato, ou seja, mais da metade, Lula aprendeu uma lição política que passou a acompanhá-lo daí por diante: no poder, não se deve nomear quem não pode ser demitido. A lição surgiu a partir do momento em que ele anunciou uma reforma ministerial, que ia e voltava, feito um coelho de quermesse, procurando uma saída, o que inviabilizava a mudança. Durante quase seis meses, o país inteiro ficou na expectativa de uma reforma ministerial, que acabou não acontecendo, provocando o desgaste político do governo.
Lula, depois de eleito presidente em 2002, vale lembrar, demonstrou muita paciência no fechamento da equipe que iria com ele para Brasília. Metáforas futebolísticas à parte, o fato é que os analistas perderam, porque Lula se revelou um fenômeno não apenas eleitoral, mas também político, queiram ou não queiram seus adversários. Os cientistas políticos, em dezembro de 2002, insistiram que ele jamais seria um fenômeno político. Eles argumentavam que Lula foi eleito puxando a onda vermelha, que elegeu muitos governadores de outros partidos e poucos, pouquíssimos do PT. A visão que prevalecia entre os formadores de opinião era que os partidos com os quais o PT se coligou não lhe asseguravam a maioria do Congresso Nacional, para garantir a aprovação das reformas que Lula pretendia promover, ressaltando também a mínima tranquilidade na governabilidade.
Mas o presidente eleito foi cauteloso, demonstrando paciência e bom propósito para escolher a sua equipe de ministros, com todo o empenho para convergir opiniões que divergem. Isso explica a sua visita à Casa Branca, para encontro com o então presidente George W. Bush, que passou a tratá-lo por “companheiro”, depois de saber de sua empreitada no combate à fome. No retorno de Washington, Lula surpreendeu mais uma vez, ao convidar o banqueiro Henrique Meirelles, que tinha presidido o BankBoston, para comandar o Banco Central brasileiro, provocando Heloísa Helena, então companheira do PT.
Começando a ter intimidade com o poder, Lula passou a concluir que ele passaria, daí por diante, a ser um blindex, quando estava acostumado a ser estilingue. Prever o que iria acontecer seria impossível, mas ele sabia que a bola iria rolar em campo no exato momento em que recebesse a faixa presidencial. Sua posse, no dia primeiro de janeiro de 2003, foi a demonstração da maturidade da democracia brasileira. Depois da festa, começaram a surgir os problemas. Já em seu primeiro dia de instalação no gabinete presidencial, ele cumpriu uma maratona de 12 horas de expediente. Percebeu, então, que o poder não é só litúrgico. Com o tempo, surgiram outros problemas, como o mensalão, que quase o ejetou da poltrona do terceiro andar do Palácio do Planalto. Ele conseguiu dar a volta por cima e se reeleger, possibilidade que os seus adversários não acreditavam que ele conseguiria.
No dia 15 de dezembro, houve grande evento no Palácio do Planalto, que reuniu 37 ministros e também o ex José Dirceu, além de Matilde Ribeiro e Benedita da Silva, que lhe causaram problemas políticos e administrativos. O sentido para aquela cerimônia seria a apresentação de um calhamaço de seis volumes, contendo três mil páginas, com o balanço dos oito anos de seu mandato. Como a modéstia não é uma das suas virtudes, Lula afirmou que fez mais do que todos os seus antecessores, simplesmente “porque os outros não fizeram nada”.
Lógico que, em uma situação como essa, ele aproveitou para elogiar a sua sucessora, Dilma Rousseff, eleita graças a ele: “Somos a nação do Pré-Sal, a nação da Copa do Mundo, das Olimpíadas e, se depender da dona Dilma e do dom Guido, vamos ser a quinta economia do mundo em 2016 e vamos conquistar essa medalha de ouro”.
Um registro que não pode deixar de ser mencionado: Dilma Rousseff foi mais aplaudida do que ele... (Fonte: Brasília em Dia).
No dia 14 de dezembro, quando faltavam 15 dias para Lula descer liturgicamente a rampa que ele subiu para assumir o poder, conquistado pelo voto, o presidente começou a se despedir da forma que ele mais sabe fazer, com discursos, sempre em sua forma coloquial, que mais parece uma conversa entre amigos. Neste dia, em viagem pelo Nordeste, sua região (ele nasceu em Pernambuco), Lula, embora emocionado, no município sertanejo de Salgueiro, que fica a 518km de Recife (PE), aproveitou para se deliciar, criticando as elites da região, ou seja, os antigos coronéis da política. Na ocasião, Lula manifestou o propósito de não vestir o “pijama” e se mostrou disposto a organizar a memória e a emoções que sentiu, convivendo com os homens mais poderosos do mundo, sendo reconhecido por seu colega Barack Obama como “o cara”.
Lula, na despedida em Pernambuco, avisou, em tom emocional: “Não verei vocês até ano que vem. Mas estejam certos de uma coisa: eu disputei eleições em 1989, 1994 e 1998 e perdi. E, a cada vez que perdia, eu não me escondia. Eu voltava para a rua. Depois, ganhei 2002, ganhei 2006. Elegemos a companheira Dilma, que pode fazer um governo melhor do que eu fiz. Se, quando eu perdia, eu não me escondia, por que vou me esconder agora que eu ganhei?”.
A ascensão de Lula começou a ser sinalizada em junho de 2002, quando a sua agenda já não comportava mais compromissos de presidenciáveis, mas sim de presidente da República eleito, quando sua presença era mais importante. Naquela época, ele simplesmente alegava compromissos familiares para justificar sua ausência em debate promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), com o propósito de ouvir suas propostas para o setor da construção. A razão, soube-se depois, para o desapontamento dos empresários foi, na verdade, que ele preferiu se ocupar diante das lentes dos fotógrafos de estrelas do nível de Vera Fischer e Luana Piovani, que naqueles anos faziam muito sucesso.
Metido em um bem cortado terno assinado por Bruno Minelli, um dos mais caros do país na época, ele fez poses para uma sessão de fotos encomendada pelo marqueteiro Duda Mendonça, que coordenava a imagem do então candidato. As fotografias seriam usadas na propaganda eleitoral a ser impressa.
Ou seja, não prosperou o esforço dos seus adversários em torná-lo Sassá Mutema, personagem vivido por Lima Duarte, em uma trama ambientada em duas cidades fictícias (Tangará e Ouro Verde). O personagem era um boia-fria, agricultor que trabalhava em diversas lavouras, mas não tinha a sua. Ou seja, estimulada ou não, muita gente via uma certa semelhança entre o personagem e o operário na vida real, porque na época ele não dominava a língua portuguesa falando ou escrevendo.
Durante uma viagem à Venezuela, em julho de 2003, já assimilado ao poder, Lula, durante um encontro com o seu colega Hugo Chávez, tocando um violino, ele reacendeu a teoria atribuída ao general Juan Domingo Perón, ao conquistar o governo da Argentina (“O poder é como o violino, toma-se com a esquerda e toca-se com a direita”). Logo depois, o presidente brasileiro, durante uma entrevista coletiva, falou sobre o seu passado sindicalista e afirmou que nunca admitiu que o rotulassem como esquerdista. Toda essa pressa em esclarecer posições ideológicas se devia ao fato de ser citado pela mídia como um estadista de esquerda. Ele tratou de mostrar sua posição: “Em toda a minha vida, nunca gostei de ser rotulado de esquerda. E, na primeira vez que me perguntaram se eu era comunista, respondi-lhes: ‘Sou torneiro mecânico!’”.
Com o tempo, Lula foi absorvendo o lado leve do poder, tornando-se um globe-trotter, fazendo viagens internacionais. Em setembro de 2003, ele fez sua estreia na ONU, abrindo a 58ª Assembleia Geral, com um pronunciamento cuja frase de efeito foi o “caminho da paz é o combate à fome e à miséria, numa formidável campanha de solidariedade capaz de unir o planeta em vez de aprofundar divisões e os ódios que conflagram os povos e semeiam o terror”.
Mas, cautelosamente, diante de um George W. Bush, que se encontrava no plenário ouvindo seu pronunciamento, evitou citar os Estados Unidos ao atacar a política americana, evitando passar por cima da ONU e das instituições internacionais: “Pode-se até vencer uma guerra isoladamente, mas não se pode construir paz duradoura sem o concurso de todos. A ONU não foi concebida para remover os escombros dos conflitos que não pôde evitar”. De uma forma ou de outra, alfinetou Bush sutilmente.
Quando ele já havia consumido 26 meses de seu primeiro mandato, ou seja, mais da metade, Lula aprendeu uma lição política que passou a acompanhá-lo daí por diante: no poder, não se deve nomear quem não pode ser demitido. A lição surgiu a partir do momento em que ele anunciou uma reforma ministerial, que ia e voltava, feito um coelho de quermesse, procurando uma saída, o que inviabilizava a mudança. Durante quase seis meses, o país inteiro ficou na expectativa de uma reforma ministerial, que acabou não acontecendo, provocando o desgaste político do governo.
Lula, depois de eleito presidente em 2002, vale lembrar, demonstrou muita paciência no fechamento da equipe que iria com ele para Brasília. Metáforas futebolísticas à parte, o fato é que os analistas perderam, porque Lula se revelou um fenômeno não apenas eleitoral, mas também político, queiram ou não queiram seus adversários. Os cientistas políticos, em dezembro de 2002, insistiram que ele jamais seria um fenômeno político. Eles argumentavam que Lula foi eleito puxando a onda vermelha, que elegeu muitos governadores de outros partidos e poucos, pouquíssimos do PT. A visão que prevalecia entre os formadores de opinião era que os partidos com os quais o PT se coligou não lhe asseguravam a maioria do Congresso Nacional, para garantir a aprovação das reformas que Lula pretendia promover, ressaltando também a mínima tranquilidade na governabilidade.
Mas o presidente eleito foi cauteloso, demonstrando paciência e bom propósito para escolher a sua equipe de ministros, com todo o empenho para convergir opiniões que divergem. Isso explica a sua visita à Casa Branca, para encontro com o então presidente George W. Bush, que passou a tratá-lo por “companheiro”, depois de saber de sua empreitada no combate à fome. No retorno de Washington, Lula surpreendeu mais uma vez, ao convidar o banqueiro Henrique Meirelles, que tinha presidido o BankBoston, para comandar o Banco Central brasileiro, provocando Heloísa Helena, então companheira do PT.
Começando a ter intimidade com o poder, Lula passou a concluir que ele passaria, daí por diante, a ser um blindex, quando estava acostumado a ser estilingue. Prever o que iria acontecer seria impossível, mas ele sabia que a bola iria rolar em campo no exato momento em que recebesse a faixa presidencial. Sua posse, no dia primeiro de janeiro de 2003, foi a demonstração da maturidade da democracia brasileira. Depois da festa, começaram a surgir os problemas. Já em seu primeiro dia de instalação no gabinete presidencial, ele cumpriu uma maratona de 12 horas de expediente. Percebeu, então, que o poder não é só litúrgico. Com o tempo, surgiram outros problemas, como o mensalão, que quase o ejetou da poltrona do terceiro andar do Palácio do Planalto. Ele conseguiu dar a volta por cima e se reeleger, possibilidade que os seus adversários não acreditavam que ele conseguiria.
No dia 15 de dezembro, houve grande evento no Palácio do Planalto, que reuniu 37 ministros e também o ex José Dirceu, além de Matilde Ribeiro e Benedita da Silva, que lhe causaram problemas políticos e administrativos. O sentido para aquela cerimônia seria a apresentação de um calhamaço de seis volumes, contendo três mil páginas, com o balanço dos oito anos de seu mandato. Como a modéstia não é uma das suas virtudes, Lula afirmou que fez mais do que todos os seus antecessores, simplesmente “porque os outros não fizeram nada”.
Lógico que, em uma situação como essa, ele aproveitou para elogiar a sua sucessora, Dilma Rousseff, eleita graças a ele: “Somos a nação do Pré-Sal, a nação da Copa do Mundo, das Olimpíadas e, se depender da dona Dilma e do dom Guido, vamos ser a quinta economia do mundo em 2016 e vamos conquistar essa medalha de ouro”.
Um registro que não pode deixar de ser mencionado: Dilma Rousseff foi mais aplaudida do que ele... (Fonte: Brasília em Dia).
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