quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Jornal Nacional: notícias requentadas II

Richard Jakubaszko
A propósito do post de 6 de dezembro, sob o mesmo título acima (ver no link a seguir: Richard Jakubaszko), o visitante deste blog pode ler no artigo abaixo, do médico toxicologista Prof. Dr. Ângelo Zanaga Trapé (e que é ex-colaborador da Anvisa), considerações interessantes sobre a tal pesquisa da ANVISA, de 2010:
Os Resultados do PARA e Segurança Alimentar: Contribuição da Ciência e da Toxicologia para sua interpretação e compreensão:

Prof. Dr. Angelo Zanaga Trapé
Coordenador da Área de Saúde Ambiental
Coordenador do Programa de Monitoramento de Populações Expostas a Agrotóxicos
Departamento de Saúde Coletiva Faculdade de Ciências Médicas - Unicamp
Em Dezembro de 2011 a ANVISA, divulgou os resultados do PARA, Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos. Na divulgação feita em rede nacional pela mídia a ANVISA informou que foram realizadas análises em 2488 amostras de diversos produtos da hortifruticultura para variados ingredientes ativos (i.as.) que compõem os agrotóxicos.
Do total das amostras analisadas, segundo a ANVISA, 28%, ou seja, 694 apresentaram-se insatisfatórias, sendo o pimentão o principal alimento com maior índice de amostras insatisfatórias, perto de 91%.
Para entendermos o significado do parâmetro “insatisfatório” da agência e podermos interpretar os resultados de maneira científica é preciso que a base da avaliação seja a metodologia científica em Toxicologia (disciplina da Ciência que estuda os efeitos dos agentes químicos em geral nos seres vivos).
A metodologia em Toxicologia tem como princípio básico para qualquer substância química (medicamentos, produtos industriais, metais pesados, agrotóxicos), a relação DOSE=RESPOSTA, ou seja, para haver uma resposta nos organismos vivos, seja ela benéfica ou não, é necessário haver a absorção de uma dose capaz de determinar alguma alteração do organismo, boa ou ruim.
A Toxicologia moderna ainda mantém o ensinamento de Paracelsus, médico belga que iniciou os conhecimentos científicos nessa disciplina há mais de 500 anos: “A dose faz o remédio, a dose faz o veneno”. Portanto, não é qualquer dose ou resíduo de uma substância química, no caso os agrotóxicos, que pode ser capaz de determinar alterações prejudiciais nos seres humanos seja de curto , médio ou longo prazo. A Clínica e a Epidemiologia em Toxicologia nos ensinam isto.
No caso dos alimentos, as agências internacionais que regulam níveis de resíduos de substâncias químicas em alimentos ingeridos “In natura”, ou processados, estabelecem há muitas décadas valores, níveis aceitáveis dessas substâncias (conservantes, corantes, realçadores de sabor, agrotóxicos) sem causar danos à saúde humana pelo consumo cotidiano desses alimentos durante a vida.
Para os alimentos analisados pelo PARA, o parâmetro que deve ser respeitado pela agência reguladora ANVISA, para que uma amostra seja “satisfatória” ou “ insatisfatória” deve ser o Limite Máximo de Resíduos (LMR) de ingredientes ativos (i. as.) em um determinado alimento, abaixo dos quais não há preocupação em termos de saúde pública.
Voltando aos resultados do PARA de 2010, temos que 28% das amostras, ou seja, 694 foram consideradas “insatisfatórias” pela agência, porém quando analisamos cientificamente os dados vemos que, deste total, somente 42 ou 1,7% das 2488 amostras tinham algum resíduo acima do parâmetro aceito internacionalmente, o limite máximo de resíduo, LMR. A maior parte, 605 amostras, ou 24,3% eram detecções de i.as. não registrados para aquela cultura, mas com registro para outras culturas no país.
Avaliando os alimentos realçados pela agência e pela mídia, como os mais “contaminados” temos o seguinte:
1º) Pimentão - segundo ANVISA, 91% de 146 amostras “insatisfatórias”, porém 84,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs. Amostras com detecção acima do LMR = 0,00% segundo o relatório da ANVISA
2º) Morango - segundo ANVISA, 64,3% de 112 amostras “insatisfatórias”, porém 51,8% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs. Amostras com detecção acima do LMR = 3, ou 2,7% segundo o relatório da ANVISA.
3º) Pepino - segundo a ANVISA, 57,4% de 136 amostras “insatisfatórias”, porém 55,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs. Amostras com detecção acima dos LMRs- 2 ou 1,5%
4º) Alface - segundo a ANVISA, 54,2% de 131 amostras “insatisfatórias, porém 51,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura mas baixo dos LMRs. Amostras com detecção acima dos LMRs = 0,00%.
5º) Cenoura - segundo a ANVISA, 49,6% de 141 amostras “insatisfatórias”, porém 48,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs. Amostras com detecção acima dos LMRs = 0,00%
Este problema é fitossanitário, de extensão de uso de um agrotóxico de uma cultura para outra(s) e não de saúde pública, pois o parâmetro que deveria ser respeitado pelo órgão regulador, o LMR não foi ultrapassado. Mesmo nos casos de culturas onde ocorreu detecção de resíduos acima dos LMRs pelo relatório, os valores são muito baixos e têm como unidades de valor miligramas do i.a., por quilo do alimento. Do ponto de vista de saúde, à luz do método em Toxicologia, principalmente DOSE=RESPOSTA, os valores são muito baixos, não indicando riscos para a população consumidora desses alimentos em curto, médio ou longo prazo.
Como conclusão, fazendo uma leitura dos resultados do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos - PARA, da ANVISA, com base na metodologia científica que deve sustentar qualquer estudo, relatório, norma ou portaria, principalmente de uma agência reguladora nacional, podemos dizer que os alimentos analisados em 2010 mostraram uma adequada segurança química, indicando à população brasileira tranquilidade para o consumo desses alimentos.
COMENTÁRIOS ADICIONAIS DO BLOGUEIRO:
Registro abaixo, porque muito relevante, que inúmeros profissionais ligados ao setor sentiram-se preocupados e até mesmo indignados com a divulgação deturpada dos dados da pesquisa, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), com visível preocupação alarmista e panfletária.
A publicação do material provoca descontentamento no setor produtivo, que afirma que os níveis de resíduos de agrotóxicos nos alimentos estão abaixo dos índices internacionais. Abaixo algumas dessas manifestações:
Anita de Souza Dias Gutierrez, responsável pelo Centro de Qualidade em Horticultura da Ceagesp:
“A Ceagesp realiza estudo semelhante ao da Anvisa anualmente. Em 450 amostras monitoradas, é semelhante, mas com outro posicionamento. Eu não sei se a Anvisa acredita que o terrorismo alimentar vai resolver alguma coisa. Na prática, ela pune todos os produtores. Quando publica isso desta maneira, sem apontar discussão ou a verdadeira causa, ela está destruindo 20 mil produtores.”.
Leonardo Vicente da Silva, coordenador setorial de Controle de Agrotóxicos da Secretaria de Estado de Agricultura do Rio de Janeiro:
“Nos dias seguintes ao anúncio do PARA, houve forte retração nos preços pagos ao produtor. Uma caixa de pimentão que custava R$ 20, está sendo vendida por R$ 3, quando só a caixa de madeira que conserva o produto custa R$ 2,50”.
José Robson Coringa Bezerra, presidente da Câmara Federal de Hortaliças:
“O grave da pesquisa não é o índice de contaminação, considerado baixo pelos especialistas. O registro de produtos que devem ser utilizados tem que ser feito, porque os produtores usam produtos registrados em outras culturas. E estas culturas, principalmente do pimentão, não têm registro.”
Angelo Zanaga Trapé, médico toxicologista / UNICAMP:
“A maneira como os dados foram divulgados foi equivocada. Em 30 anos de experiência, nunca recebi um paciente contaminado por agrotóxicos. Apesar de existir a presença da substância nas amostras, menos de 2% ficaram acima do índice tolerado. Se analisarmos cientificamente os dados que o programa da Anvisa apresenta, 98,3% das amostras, de 2,48 mil, indicam valores abaixo de um parâmetro aceito em nível mundial. Isso indica que a população está segura em termos de alimentação com esses produtos.”
Ossir Gorenstein, engenheiro agrônomo responsável pelo Centro de Qualidade Hortigrajeira, da CEAGESP:
“Na ausência de uma autoridade sanitária que exerça o papel de informar e esclarecer a população sobre os reais perigos dos agrotóxicos, principalmente nos alimentos, urge que alguém com algum conhecimento do problema o faça, para não se sentir omisso e conivente com a mentira. A desinformação tem o propósito de transformar uma questão normativa, ou legal, em um falso drama epidemiológico (...) As considerações são necessárias para que não passem, como verdades, falácias lançadas em uma luta política, e para que cidadãos possam melhor se esclarecer a respeito do real perigo representado pelos agrotóxicos para a nossa saúde.”
Mariliza Scarelli Soranz, presidente da Associação Hortifrutiflores de Jarinu, SP, e diretora do Instituto Brasileiro de Frutas, IBRAF:
“A divulgação e as reportagens equivocadas prejudicam o segmento e deixam os produtores extremamente desmotivados a permanecerem na agricultura, pela baixíssima demanda desses alimentos. A sociedade também sofre as consequências, pois a agropecuária é um forte eixo de sustentação da economia do país.”
Ronaldo Tofanin, produtor de pimentão/fornecedor do Ceagesp/Campinas:
“Depois das reportagens sobre a pesquisa da Anvisa, a caixa do pimentão, que estava a um preço médio de R$15 a R$18, caiu para R$8. E, mesmo assim, ninguém quer comprar mais. Das 50 caixas por dia que eu levava ao Ceagesp de Campinas, voltaram 30 na última quarta-feira”._

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